O torcedor do Real Madrid precisa mirar uma nova obsessão, porque a busca pela décima Liga dos Campeões acabou. O fim da espera de 12 anos foi espetacular e até mais bonito do que teria sido com uma atuação brilhante de seus craques, como era esperado. Foi preciso se igualar à raça do Atlético e deixar tudo o que tinha em campo para golear de virada os colchoneros na prorrogação, por 4 a 1, no Estádio da Luz, em Lisboa, em uma inédita final entre dois times da mesma cidade.
Após três anos consecutivos parando nas semifinais, o maior vencedor da história da Champions volta ao posto mais alto do continente. Tudo parecia perdido até os 48 minutos do segundo tempo, quando o zagueiro Sergio Ramos subiu de cabeça para marcar o gol de empate, igualando o placar aberto por Godín aos 35 de jogo, em falha de Casillas. Na prorrogação, o galês Bale se redimiu de chances desperdiçadas ao iniciar a virada, aos quatro da última etapa. A três minutos do fim, o brasileiro Marcelo ampliou a vantagem com um chute rasteiro. Mas a festa só se completou com Cristiano Ronaldo selando a conquista, de pênalti, sofrido por ele mesmo, aos 15.
Foi um duelo entre dois times valentes. Depois de fazer uma partida pior nos primeiros 90 minutos, o Real precisaria ter mais coração que o Atlético para vencer a décima Liga dos Campeões. Motivados pelo gol nos acréscimos, os merengues ignoraram as dores, dominaram a prorrogação, e em uma jogada de Di Maria, o grande astro do time na partida, chegaram ao gol improvável. Cristiano Ronaldo, apagado e bem marcado, conquistou sua segunda Champions e viveu o sonho de ser coroado rei em Portugal, diante de seu povo. A decepção da final foi Diego Costa, artilheiro do Atlético, que jogou somente oito dos 120 minutos, e viu do banco seu time perder um título que parecia ganho.
Mais do que levantar seu segundo título no ano – conquistou também a Copa do Rei -, o Real Madrid consegue prorrogar a maldição do Atlético, de nunca ter vencido uma Champions, e trazer um filme de volta à cabeça dos colchoneros. Há 40 anos, na única final de Liga dos Campeões que o time havia disputado, o título também estava garantido até os últimos minutos, quando o Bayern de Munique fez um gol e acabou com a festa, forçando um jogo extra, vencido pelos alemães por 4 a 0. O sonho foi estraçalhado mais uma vez, de forma dramática. Não importa o que aconteça daqui para frente, a geração de Simeone ficará eternizada pelo título do Campeonato Espanhol e a boa campanha na Liga dos Campeões, mas também carregará consigo esta marca para sempre.
SUSTO E VIBRAÇÃO COLCHONERA
Nos primeiros minutos, o Atlético de Madrid deu uma grande demonstração de organização e tranquilidade, diante da forte pressão imposta pelo Real Madrid. Custou caro aos merengues chegar perto do gol de Courtois. Que falta fez Xabi Alonso, fora da final por uma suspensão. O alemão Khedira, que jogou em seu lugar, perdeu quase todas as disputas em que entrou, inclusive a mais importante delas, de onde saiu o primeiro gol do Atlético.
A perda de Diego Costa, substituído por Adrián logo aos oito minutos, não mexeu com os colchoneros, que se mantinham firmes, defendendo em duas linhas de quatro e esperando o Real. Assim, evitaram os contra-ataques mortais do adversário, principal arma do italiano Carlo Ancelotti. Por isso, não foi um jogo de muitas chances na primeira etapa.
Os merengues tiveram Cristiano Ronaldo extremamente bem marcado, sempre com um jogador próximo e outro na cobertura, e precisaram contar com o talento de Di María para arrancar as melhores oportunidades do time e levantar a torcida com seus dribles empolgantes e futebol de alta fluidez. Fez tanto que acabou sofrendo carrinho por trás de Raúl García, punido apenas com o cartão amarelo, e expôs a rivalidade madrilenha em campo, com troca de empurrões e provocações de Sergio Ramos, advertido pelo árbitro também, e Fabio Coentrão com Gabi.
Quando o Real conseguia chegar perto do gol do Atlético, não tinha espaço. O pouco que tinha não era o suficiente para conseguir uma finalização boa o suficiente para bater o seguro goleiro Courtois, que mostrou mais uma vez que é um dos melhores do mundo, mesmo ainda aos 22 anos. Até quando não defende, o goleiro faz a diferença. Na melhor oportunidade merengue no primeiro tempo, o português Tiago falhou na saída da defesa e deu passe para Bale, que saiu em disparada em direção ao gol e fez tudo corretamente, até a hora do chute. O galês sabia que uma conclusão qualquer não bateria Courtois, buscou o canto, e terminou a jogada se lamentando pelo excesso de capricho ao ver a bola saindo pela linha de fundo.
Simeone viu que estava na hora de mudar de postura. Desesperadamente, pediu ao seu time, quase entrando no gramado, para que pressionassem a saída de bola do Real. Foi assim que o Atlético ganhou escanteios para poder explorar a maior força de sua equipe: as jogadas aéreas. Assim, aos 35 minutos, Gabi cobrou, Varane afastou, e na sobra frontal Juanfran colocou de novo para a área pelo alto. Na marca do pênalti, Godín subiu mais do que Khedira, cabeceou forte e aproveitou a saída em falso de Casillas. A bola encobriu o goleiro e só não foi de imediato para o fundo da rede porque o camisa 1 ainda conseguiu pular nela para tentar evitar o gol. Só que foi muito tarde. A abertura do placar incendiou a torcida e mostrou um Atlético psicologicamente mais inteiro em campo até o fim do primeiro tempo.
PRESSÃO E SALVAÇÃO MERENGUE
O Atlético voltou melhor no segundo tempo também. Em uma primeira oportunidade, quase ampliou o placar com estilo, quando Koke cruzou bonito para Raúl García pegar de primeira dentro da área. O chute foi para fora, e o Real Madrid ainda não tinha entrado no jogo.
Quem precisou incendiar a partida novamente foi Di Maria. Depois de driblar três e levantar o Estádio da Luz, onde jogou quando defendia as cores do Benfica, foi parado por Miranda com falta. O argentino fazia o que Bale e Cristiano Ronaldo, com marcação mais forte, não conseguiam. Mas isso iria mudar.
CR7 apareceu bem na partida pela primeira vez aos oito minutos, na cobrança da falta sofrida por Di Maria. Courtois defendeu o chute com jeito estranho, mandando para escanteio. Depois do levantamento na área, a bola sobrou para o português, que teve chute desviado para fora. A segunda cobrança foi direta na cabeça de Cristiano Ronaldo, que mandou para fora. O craque voltou determinado a mudar a história do jogo.
Ancelotti também não estava satisfeito com o cenário e decidiu mudar. O técnico colocou um time mais ofensivo em campo ao trocar Fabio Coentrão pelo brasileiro Marcelo e Khedira, o pior em campo, por Isco. Começou a pressão. O Real perdeu um gol claro após Cristiano Ronaldo e Benzema furarem cruzamento na área, aos 16. A partida ganhou nova cara, mas o Real Madrid desperdiçava as poucas chances que tinha. Isco chutou para fora uma sobra na entrada da área, aos 22.
Bale também tinha dificuldades em acertar o alvo. O galês, que custou 91 milhões de euros (cerca de R$ 300 milhões) ao Real Madrid, e já havia desperdiçado a melhor oportunidade do time na primeira etapa, perdeu duas chances claras de empatar o jogo, aos 28 e aos 32, e irritou a torcida merengue.
Mas o Real Madrid nunca desistiu, e foi recompensado por isso. Intensificou a pressão nos últimos minutos e, quando tudo parecia acabado, e o Atlético tinha uma das mãos na taça, aos 48 do segundo tempo, Sergio Ramos arrancou o gol de empate. O zagueiro teve sangue frio ao cabecear escanteio cobrado por Modric e colocar a bola no cantinho, inalcançável para Courtois. Os merengues igualaram na raça e ganharam a chance de disputar uma merecida prorrogação.
VIRADA NOS 11 MINUTOS FINAIS
No começo da prorrogação, foi difícil imaginar a partida terminando de outra forma, senão nos pênaltis. Depois de intensos 90 minutos com os dois times deixando tudo o que tinham dentro de campo, faltava perna.
Ainda no primeiro tempo, vários jogadores mancaram, com seus músculos no limite do esforço. A criatividade foi comprometida e, por isso, um jogo truncado no meio não permitiu grandes chances a ninguém nos 15 minutos iniciais.
Ainda motivado pelo gol no último minuto do segundo tempo, o Real Madrid chegou melhor para os 15 minutos finais. Foi pelos pés de Di Maria, eleito melhor em campo, que veio o gol que mudou toda a história. O argentino fez grande jogada, que terminou na cabeça de Bale, para fazer 2 a 1. Abalado, o Atlético abriu a porteira para o grande campeão passar. Marcelo, em jogada individual, fez o terceiro.
E o placar foi fechado pelo melhor do mundo. Em casa, o português Cristiano Ronaldo marcou o quarto, de pênalti, sofrido por ele mesmo, aos 15 do segundo tempo. E nem adiantou a invasão de campo do técnico Diego Simeone. Em um jogo maluco e de alto nível, desses que só a Liga dos Campeões parece capaz de proporcionar, o Real Madrid sagrou-se campeão mais uma vez, La Décima.